COMUNICAÇÃO NO V ENCONTRO DE HISTÓRIA DE SINTRA PROMOVIDO PELA ALAGAMARES
José Manuel Vargas, 1948- (Lisboa). Licenciado em História e Mestrado (parte curricular) em Paleografia e Diplomática, pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa. Professor de História e de História da Arte no Ensino Secundário (1980-2007). Bolseiro da Comissão Nacional para as Comemorações dos Descobrimentos Portugueses (1996-2000) para transcrição e edição da Chancelaria de D. João II, projeto coord. por Eduardo Borges Nunes. Participação em inúmeros colóquios e congressos com comunicações sobre forais, ordens militares e temas de história medieval, regional e local.
Autor e co-autor de diversos estudos, entre os quais se destacam: Pelas Freguesias de Lisboa. Lisboa: Câmara Municipal, 1993-2000. 5 vols; colaboração com 21 artigos, no Dicionário de História dos Descobrimentos Portugueses. (dir. Luís de Albuquerque). Lisboa: Círculo de Leitores, Caminho, 1994; Foral de Alhos Vedros. Moita: Câmara Municipal, 2000. (reed. 2014); Foral de Lisboa (1500). Lisboa: Grupo de Amigos de Lisboa, 2000; Os Forais de Belmonte. Belmonte: Câmara Municipal, 2000; Livro da Vereação de Alcochete e Aldeia Galega: 1421-1422. Alcochete: Câmara Municipal, 2005; Sabonha e S. Francisco. Alcochete: Câmara Municipal, 2005; Aspectos da História de Alhos Vedros: Séculos XIV a XVI. Alhos Vedros: Junta da Freguesia, 2007; Os Forais Manuelinos do Distrito de Setúbal, in II Encontro de Estudos Locais do Distrito de Setúbal. Setúbal: Escola Superior de Educação, 2011; O Foral Novo: Torres Vedras, 1510. C.M. Torres Vedras, 2016; Canha e os seus forais, Junta de Freguesia de Canha, 2016 (no prelo).
Ao comemorarem-se os 500 anos da atribuição do foral de Colares, consideramos ser oportuno o seu estudo no contexto dos forais manuelinos da região, até porque depois da edição em 2001 do original do exemplar do senhorio[1], a Câmara Municipal de Sintra adquiriu, num leilão em 2004[2], o original que pertencera à câmara, o qual nos veio revelar novas informações que, numa análise comparativa com o outro exemplar e com outros forais da mesma área regional, nos permitem agora apresentar este contributo para um melhor conhecimento da temática em epígrafe.
No estado actual da investigação sobre esta matéria, calcula-se em cerca de 570 o total de forais outorgados por D. Manuel I, entre 1500 e 1520:
Comarcas | Unidades administrativas* | N.º de forais atribuídos |
Entre Douro e Minho | 112 | ca. 60 |
Trás-os-Montes | 97 | ca. 70 |
Beira | 261 | ca. 180 |
Estremadura | 162 | ca. 145 |
Entre Tejo e Odiana | 116 | ca. 105 |
Algarve | 13 | 10** |
*Foram consideradas as unidades administrativas incluídas no Numeramento de 1527-32 (vilas, cidades, concelhos, lugares, terras, coutos, reguengos, comendas, julgados e jurisdições).
**No Algarve, não tiveram foral Alvor, Cacela e Arenilha. Para efeitos da reforma dos forais, a comarca do Algarve foi agregada à comarca de Entre Tejo e Odiana.
Observa-se que no período inicial da reforma (1496-1509) muito poucos foram os forais atribuídos. Os forais de Lisboa (1500), Évora (1501) e Santarém (1506) serviriam de modelo a grande parte de todos os outros.
Em 1503, foi dado foral a Montemor-o-Novo, mas só registado e publicado muito mais tarde. Em 1504 foram dados os forais do Algarve[3]. Em 1508, o foral de Castelo Rodrigo.
A partir de 1510, o processo conheceu um significativo aumento, com 62 forais atribuídos, sendo de referir a ocorrência excepcional de no dia 1 de Junho de 1510, o Rei que estava em Santarém, ter assinado 38 forais. E, em 1512, também no dia 1 de Junho, em Lisboa, assinou 27. Assinale-se a coincidência de o dia 1 de Junho ser o do aniversário do Venturoso[4]. O atraso inicial na outorga dos forais deve-se não só ao facto de surgirem questões complexas sobre a arrecadação dos direitos, mas também porque Fernão de Pina estava a deslocar-se pessoalmente a todos os lugares, e só em 1510, por carta régia de 12 de Outubro[5] foi determinado que pudesse ir somente as cabeças dos almoxarifados, e se assim o entendesse, a outros lugares.
O último foral atribuído foi o da Terra Galega (um reguengo perto de Coimbra), em 25 de Abril de 1520[6].
1. A região. Os forais da Comarca de Torres Vedras.
A divisão administrativa de Portugal continental ao tempo da reforma dos forais abrangia seis comarcas: Entre Douro e Minho, Trás-os-Montes, Beira, Estremadura, Entre Tejo-e-Odiana e Algarve. Na organização feita para a reforma, a comarca do Algarve foi agregada à comarca de Entre-Tejo-e-Odiana.
A comarca de Torres Vedras foi criada depois da conclusão da reforma foraleira, já em 1533, no âmbito da subdivisão das 6 grandes comarcas a que foi necessário proceder, dado o crescimento populacional evidenciado no Numeramento Geral de 1527-1537[7]. Assim, entre 1532 e 1536, o País foi divido em 28 comarcas.
Como a região envolvente de Colares corresponde sensivelmente à Comarca de Torres Vedras, circunscrevemos a nossa análise de contexto aos forais dessa comarca.
No território da comarca de Torres Vedras, que englobava 17 circunscrições administrativas, foram dados 16 forais novos (a negrito), como se observa no mapa e quadro seguintes, em que se indica o número de moradores de cada uma das unidades administrativas, segundo o censo de 1527-32:
Aldeia Galega | Vila – 434 | |
Alenquer | Vila – 1248 | |
Arruda | Vila – 303 | |
Carvoeira | Reguengo – 24 | Não teve foral próprio. Integrado no de Sintra |
Cascais | Vila – 482 | |
Castanheira | Vila – 233 | Foral dado em conjunto a Castanheira e Povos |
Cheleiros | Vila – 56 | |
Colares | Vila – 204 | |
Enxara dos Cavaleiros | Vila – 42 | |
Ericeira | Vila – 75 | |
Mafra | Vila – 191 | |
Monte Agraço | Vila – 61 | |
Povos | Vila – 76 | Foral conjunto com Castanheira |
Sintra | Vila – 1038 | |
Torres Vedras | Vila – 1943 | O reguengo de Gradil, integrado no termo de Torres Vedras em 1527, teve foral próprio |
Vila Franca | Vila – 337 | |
Vila Verde | Vila – 122 |
Obs.: Belas, Alhandra e Alverca não surgem na lista e estariam sujeitas à correição de Lisboa. Nenhuma destas vilas teve foral manuelino.
2. O processo de preparação da reforma do foral de Colares
Para preparar o foral novo de Colares foi necessário efectuar um conjunto de diligências, exames e inquirições, entre as quais a análise do ‘foral antigo’, como atesta o próprio preâmbulo do texto da carta do novo foral: fazemos saber que por bem das sentenças, determinações gerais e especiais que foram dadas por Nós e com os do nosso Conselho e letrados acerca dos forais dos nossos Reinos e dos direitos reais e tributos que se per eles deviam de arrecadar e pagar e assim pelas inquirições que principalmente mandamos tirar e fazer em todos os lugares de nossos Reinos e Senhorios, justificadas primeiro com as pessoas que os ditos direitos reais tinham, achamos, visto o foral dado por El-Rei Dom Dinis que as rendas e direitos reais se devem aí de arrecadar e pagar na forma seguinte (fl. 1v.).
As orientações gerais sobre como as “diligências, exames e inquirições” deveriam ser feitas eram as que constavam dos “Pareceres de Saragoça”[8] e que foram de imediato observadas por Fernão de Pina e pelos outros membros da comissão de reforma dos forais, num moroso processo que na comarca da Estremadura se iniciou nos derradeiros anos do séc. XV.
Determinavam os “Pareceres de Saragoça” (artigo 7º) que os forais da Estremadura tivessem a portagem como o foral de Santarém e que (artigo 16º) as sentenças dadas sobre os forais servissem de lei geral para casos semelhantes e também para os forais de Lisboa e Santarém.
Conservaram-se alguns processos de preparação dos forais da comarca de Torres Vedras (autos de diligência, inquirições, apontamentos, minutas e sentenças). Esses processos, por vezes não datados, muito raramente estão completos e devidamente catalogados, mas pela conjugação das informações, é possível uma reconstituição aproximada do que terá sido o processo de elaboração do foral de Colares.
Data | Processo | Fonte |
s.d. | Minuta para os forais novos da Estremadura | Gav. 20-11-37 |
s.d | Processo feito para o foral de Torres Vedras | Gav. 20-12-41 |
s.d. | Processo feito para o foral da Ericeira | Gav. 20-11-34 |
1500, Julho, 4 – 1504, Julho, 16 | Libelo dos moradores de Cheleiros e acórdão no Juízo dos Feitos dos Forais | Gav. 18-1-9 |
1500, Fev. 4 – 1504, Julho, 27 | Processo feito para o foral novo da Vila de Alenquer | Gav. 20-11-3 |
1515 | Minuta para o foral de Monte Agraço | Gav. 14-6-24 |
1516, Julho, 18 | Instruções para os forais de Colares, Cheleiros e Arruda | Gav. 20-11-27 |
1516, Out., 22 | Processo feito para o foral de Cheleiros | Gav. 20-11-24 |
1518, Set., 10 | Processo para o foral de Enxara de Cavaleiros | Gav. 20-11-36 |
Embora não tenha chegado até nós o processo elaborado para o foral de Colares, podemos com relativa segurança presumir do seu conteúdo e da data aproximada da sua feitura, a partir das instruções que Brás de Ferreira, procurador dos Feitos dos
Forais da Estremadura, recebeu de Fernão de Pina, em 18 de Julho de 1516, sobre o modo de fazer as diligências e inquirições para concluir o processo antes iniciado. Nessas instruções[9], é dito que Brás de Ferreira devia fazer uma reunião com os representantes da câmara e do senhorio, em que estivessem presentes os homens-bons e mais antigos do concelho, e inquiri-los sobre os artigos de um libelo [cujo original não se conhece] que tinham apresentado e fazer perguntas sobre a arrecadação das rendas e direitos reais, direito do foral, portagem, gado do vento, pena de arma, dízima das sentenças, montados, maninhos, sesmarias, pensão dos tabeliães, salaio, alcaidaria, almocrevaria, moendas e outros quaisquer foros gerais ou particulares. A seguir às instruções para Colares, é mandado que seja seguido o mesmo procedimento em Cheleiros: “Item levareis também o feito do foral de Cheleiros, onde fareis as mesmas perguntas como em Colares, com tudo o mais que dito é”.
Ora, sendo conhecido o feito do foral de Cheleiros que decorreu entre 4 de Julho de 1500 e 16 de Julho de 1504[10] e o auto de diligências e inquirições efectuadas em 22 de Outubro de 1516[11], bem como os apontamentos e despacho de Rui Boto e Rui da Grã e a minuta para se fazer o foral, deduz-se que também o processo para a feitura do foral de Colares se tenha inciado com a apresentação de um feito pelos moradores, através de um procurador, por volta de 1500, e que as diligências para concluir o processo tenham ocorrido de modo idêntico a Cheleiros, em Setembro ou Outubro de 1516.
No libelo dos moradores de Cheleiros, apresentado pelos procuradores João Cotrim e Álvaro do Concho, foi anexada uma cópia do foral antigo do lugar (Foral do reguengo de Polvorais, Fevereiro de 1195) para provar que o senhorio do lugar, então D. Álvaro de Ataíde, estava a agravar os direitos, em particular dos lavradores e segadores do pão. O acórdão em Relação, dado pelos desembargadores Rui Boto, João Pires e Rui da Grã, deu razão aos moradores. Fernão de Pina, em 1516, averbou no libelo a seguinte nota: “Brás de Ferreira tirou a inquirição per mandado de el-rei, com as outras coisas para foral necessárias, segundo se fez nos outros lugares do Reino todo”.
Quanto ao auto de diligências, em resumo, diz o seguinte:
“Ano do nascimento de Nosso Senhor Jesus de 1516 anos, aos 22 dias do mês de julho da dita era, em a vila de Cheleiros, terra do senhor D. Fernando de Ataíde, no paço do concelho da dita vila, estando aí Pero Álvares, juiz ordinário, e Álvaro Martins e Pero Anes, vereadores, e Gaspar Ferreira, procurador do dito concelho, e bem assim estando aí Martim Galego e João Rodrigues e Álvaro Anes e Diogo Anes e Brás (?) e Duarte Fernandes e João Álvares e João da Torre, o Velho, moradores na dita vila, e Fernão Rodrigues e Pero Gaitoso e João do Castelo e João Vaz, moradores no termo da dita vila e outros do povo que pera o auto seguinte foram chamados, e Fernão Martins, escrivão da câmara que ora tem o cargo per o senhor D. Fernando de Ataíde, e logo aí pareceu Brás de Ferreira e apresentou um alvará de el-Rei, nosso senhor, per que manda sua alteza a justiças que lhe leixem fazer quaisquer inquirições e autos que pertencem aos forais. E por vontade dele se deu logo juramento aos Avangelhos a todos assim presentes e lhes amostrou um feito que fora ordenado na Corte e ordenado per os apontamentos que se deram deste concelho e assim fez as perguntas seguintes” (seguem-se as perguntas e respectivas respostas sobre os artigos referidos nas instruções acima citadas). No final da inquirição, assinaram todos os presentes. Em presença do auto, Fernão de Pina preparou os apontamentos para a feitura do foral que foram validados pelos desembargadores Rui Boto e Rui da Grã, da comissão de reforma dos forais. Fez-se depois a minuta para o foral, tendo em consideração o foral antigo e a inquirição. Um averbamento na margem, da mão de Brás Ferreira, informa-nos que mostrou o processo a D. Fernando de Ataíde, o qual deu a sua concordância para que se fizesse o foral.
Outro processo que se conservou bastante completo foi o do foral da Ericeira, com auto de diligências, inquirições e minuta, e que dada a similitude com Cheleiros e Colares, o referimos, resumidamente.
O auto de diligências foi efectuado em 21 de Abril de 1506 pelo próprio Fernão de Pina e teve início com uma reunião pública na câmara:
Eyryceyra
A xxj dias d’Abrill de bc bj na eiriceira, na camara sua, presemte Joam Fernandez de Sousa, senhor do dito lugar e Pedr’ Eanes, juiz, e Gonçalo Fernandez e Yoam Pires, vereadores, e Amtom Anes, procurador [do concelho], e Yoam Brás, por almoxarife que foy (…) e (…) que passava de Lxxb anos, e Yoam Afonso, desta idade, e Gonçal’Eanes, e Alvoro Gonçalves e Yoam Alvares, Afomso Anes, Luys Eannes, Yoam Annes, Gonçalo Pires, todos homens bons e antigos da dita vila, nomeados particularmente, e todollos outros moradores e a mayor parte deles jumtos per mym lhe foy dado juramento em forma que dissessem de tudo a verdade (…..) (seguem-se as assinaturas).
Respondidas às inquirições, voltaram a assinar. Segue-se o despacho de Rui Boto e Rui da Grã. “Faça-se ho foral per estes apontamentos e que das cousas contheudas no foral nom se pagará senom o que ora se paga. Polla menuta da Estremadura, tyrando augoa, todo o all, scilicet, com a sacada”.
Embora o auto de diligências e as inquirições que serviram de base ao foral da Ericeira estejam datados de 1506, sabe-se que o processo tinha começado, pelo menos, em 1501, e que tinha havido uma tentativa de proceder a inquirições, em 1503, como comprovam dois documentos, resumidamente publicados nos Anais da Vila da Ericeira[12]:
– 1501, Outubro, 13 – Foi apresentada ao juiz ordinário da Ericeira uma carta da câmara de Sintra, contendo um mandado de D. Manuel para que se lançasse logo uma finta de 4 reais a cada morador para pagamento das despesas da reforma dos forais, visto ser insuficiente uma outra verba já lançada para o mesmo efeito;
– 1503, Novembro, 2 – Foi presente à câmara a conta da despesa feita com o procurador dos Feitos dos Forais e respectivo escrivão que tinham ido à Ericeira fazer uma inquirição, sendo essa despesa a seguinte: pão (88 reais), duas frangas (36 reais), uma galinha (28 reais), polvos (20 reais); um congro (25 reais), mel (40 reais), inquirição de 10 testemunhas (82 reais).
Estes documentos dão-nos informações preciosas sobre a fase inicial da reforma nesta região da Estremadura, comprovando que o processo estava em marcha desde muito cedo nos vários concelhos e que eram estes a custear as despesas da reforma.
O foral da Ericeira só seria outorgado em 31 de Agosto de 1513 e publicado em 10 de Janeiro de 1517.
A partir de 1513, na Estremadura, a atribuição de forais teve um significativo incremento, sendo numerosos os forais dados, particularmente no ano de 1514.
Em 1515 ou em 1516, dado o elevado volume de trabalho de Fernão de Pina e a necessidade de concluir a reforma, foram dadas instruções a Brás de Ferreira, envolvido nos trabalhos da reforma desde 1499 como procurador dos feitos dos forais na região norte da Estremadura, para que procedesse às inquirições que faltavam e foi-lhe dado também um regimento sobre o modo de entrega e publicação dos forais. Com essa solução, tornou-se mais rápido todo o processo (inquirição-dada-publicação). Assim, tendo Brás de Ferreira recebido instruções para fazer as inquirições sobre os forais de Colares, Cheleiros e Arruda, em 18 de Julho de 1516[13], logo em 22 de Outubro de 1516 fez o auto de diligências e inquirição para o foral de Cheleiros[14] que não tardou a ser outorgado (25 de Novembro de 1516). Algo de semelhante sucedeu com os forais de Colares e Arruda, cujos processos se desconhecem, que foram dados em 10 de Novembro de 1516 e 15 de Janeiro de 1517, respectivamente. Outros forais de lugares vizinhos de Torres Vedras demoraram um pouco mais, em virtude de problemas suscitados pelos senhorios dos direitos. São os casos de Monte Agraço e de Enxara dos Cavaleiros. Em Monte Agraço, o senhorio do reguengo era D. Afonso Anes, arcebispo de Évora, e a minuta (segundo a menuta per onde se fizeram os outros foraes que he a menuta da Estremadura, pequena) estava pronta em 1515[15], mas o foral só pode ser dado em 20 de Dezembro de 1518. Na Enxara dos Cavaleiros, o processo iniciou-se em 10 de Setembro de 1518 e o foral foi dado em 20 de Novembro de 1519, mas questões com o senhorio (conde de Penela) levaram a que o processo só fosse dado por encerrado em 20 de Fevereiro de 1520[16]
3. A feitura dos forais
Concluídas as diligências e inquirições, o processo do foral estava pronto para ser examinado pelos desembargadores Rui Boto e Rui da Grã, ou apenas o primeiro, que colocavam o visto e davam um despacho para que se fizesse o foral: “Faça-se foral per estes apontamentos e per o foral de Santarém” (processo do foral de Torres Vedras). Preparava-se então uma minuta, a partir da qual um escrivão da chancelaria redigia o texto, em boa letra, em fólios de pergaminho devidamente regrados.
De cada foral deviam ser feitos três exemplares, um para a câmara, outro para o senhorio dos direitos do lugar, e outro, o registo, para a Torre do Tombo. Na parte final de cada foral, pode ler-se, com ligeiras variantes: Do teor do qual mandamos fazer três, um deles para a câmara da dita vila e outro para o senhorio dos ditos direitos e outro pera a nossa Torre do Tombo para em todo o tempo se poder tirar qualquer dúvida que sobre isso possa sobrevir. (Foral de Colares)
Concluída a escrita dos exemplares da câmara e do senhorio, o chanceler-mor Rui Boto levava o foral ao Rei para que o assinasse. A assinatura do Rei era feita no fim do texto, deixando um pequeno espaço em branco de cerca de duas ou três regras.
Depois do Rei ter assinado, o porteiro da Chancelaria guardava os forais num saco e levava-os ao chanceler-mor Rui Boto. Este colocava no foral o selo real, um selo pendente de chumbo[17], e rubricava (abreviatutura de Rodericus) junto ao orifício por onde passava o fio (em geral trancelim de seda) que suspendia o selo.
O foral voltava a ser guardado no saco. O saco era arrecadado na arca da Chancelaria, junto com outras cartas, ainda por registar, seguindo-se assim, todos os procedimentos constantes das ordenações em vigor.
4. O registo no Livro dos Forais Novos (Torre do Tombo)
Faltava agora efectuar o registo do foral na Torre do Tombo, onde havia cinco livros destinados a esse fim, ou seja, um livro por comarca.
Antes de se efectuar o registo, Fernão de Pina conferia o texto e registava ele próprio essa verificação e o número de páginas do foral, no espaço deixado em branco entre o fim do texto e a assinatura do Rei. Em vários casos, o espaço revelava-se diminuto e Fernão de Pina mesmo escrevendo com letra mais pequena, não evitava sobrepor a sua escrita às guardas da assinatura real. No foral de Colares, no exemplar da câmara, escreveu: Vai escrito em onze folhas e concertado por mim Fernão de Pina. No exemplar do senhorio: Vai escrito e concertado em onze folhas por mim Fernão de Pina. O escrivão da chancelaria escreveu no registo: E vai escrito o original em onze folhas e duas regras, subscrito e concertado pelo dito Fernão de Pina.
Esta indicação das duas regras além das onze folhas permite-nos concluir que o registo foi feito e conferido, tendo presente o exemplar da câmara, já que o exemplar do senhorio tem onze folhas e meia regra.
Em rodapé, escrevia-se exactamente a quem se destinava o foral: Foral pera Colares. Raramente se anotava a quem se destinava o exemplar, se à câmara ou ao senhorio: “Foral pera Óbidos (…) Concertados vão ambos os foraes (…) Este hé do senhorio”; “Foral pera Alcouchete e Aldea Galega. Pera o senhorio”.
Feito o registo, Fernão de Pina escrevia no foral, em geral logo na folha seguinte: Registado no tombo. E assinava: Fernam de Pyna.
O registo só era feito na totalidade para os forais cujo modelo, designadamente nos capítulos do Gado do Vento, Pena de Arma, Portagem e Pena do Foral, era seguido por outros, registados depois e que remetiam para o dito modelo. Também se evitava repetir nos registos a longa introdução justificativa da reforma dos forais. Assim sucedeu com o registo do foral de Colares que depois duma curta intitulação “Dom Manuel, e cetera” passa de imediato ao registo do capítulo do Quarto. E as 8 páginas (4 fólios, rosto e verso) dos capítulos do Gado do Vento, Dízima das sentenças, Pena de Arma, Portagem e Pena do Foral são resumidos no registo a menos de meia página: “E o capítulo do gado do vento e o da dízima das sentenças e a pena de arma e a portagem por cargas com todos os capítulos e adições, sem acrescentar nem diminuir, até ao capítulo da pena do foral em tudo é esta vila de Colares, tal como em Sintra fica declarado ut supra, tirando esta adição abaixo escrita que esta vila tem desvairada de Sintra, a qual está no fim do capítulo dos privilegiados (…). E assim o serão os vizinhos da dita vila e termo em si mesmo e assim os de Sintra onde também não pagarão os de Colares pela antiga vizinhança que sempre tiveram”
Portanto o registo do foral de Colares (fls. 240-241) remete para o registo do foral de Sintra (fls. 136-137v) que por sua vez remete nesses mesmos capítulos para o foral de Alenquer (fls. 49-52). Mas se consultarmos o registo do foral de Alenquer, não ficamos com o problema completamente resolvido, pois este, na Portagem remete para o foral de Leiria (remete para Santarém) e na Pena do Foral para o foral de Santarém. Resumindo: o registo mais completo dos forais da comarca de Torres Vedras é o de Alenquer.
Analisando, em pormenor, todos os registos de forais e a sua sequência, verifica-se que não são correspondentes e que muitos registos eram feitos vários anos decorridos desde a outorga do foral. Como regra, observada quase sempre nas cinco comarcas, registavam-se primeiro os forais das cidades e das vilas notáveis. Depois os outros, agrupados por áreas regionais, o que levava a que tivesse de se esperar que estivessem concluídos esses agrupamentos, antes de proceder ao registo.
Por exemplo, o registo do foral da Atouguia, dado em 1 de Junho de 1510, foi efectuado depois do registo do foral da Azambuja, dado em 7 de Janeiro de 1513. Ou o foral da Lourinhã, dado em 1 de Junho de 1512 e que só foi registado depois do foral da Ericeira, dado em 31 de Agosto de 1513.
Dada dos forais e sequência dos registos no Livro dos Forais Novos da Estremadura
Foral | Dada | Registo | Sequência dos registos |
Torres Vedras | 1510, Junho, 1 | 43-45 | Torres Vedras |
Vila Franca | 1510, Junho, 1 | 45-47 | Vila Franca |
Castanheira | 1510, Junho, 1 | 47-49 | Castanheira |
Alenquer | 1510, Junho, 1 | 49-52 | Alenquer |
Mafra | 1513, Julho, 1 | 215-216v | Ericeira |
Ericeira | 1513, Ago. 31 | 62-64 | Cascais |
Aldeia Galega | 1513, Out. 1 | 141v-142 | Sintra |
Vila Verde | 1513, Out. 1 | 141v | Vila Verde |
Sintra | 1514, Out. 29 | 136-137v | Aldeia Galega |
Cascais | 1514, Nov. 15 | 102-104 | Mafra |
Colares | 1516, Nov. 10 | 240-241 | Cheleiros |
Cheleiros | 1516, Nov. 25 | 237v-238 | Arruda |
Arruda | 1517, Jan. 15 | 238v-240 | Colares |
Monte Agraço | 1518, Nov. 20 | 245-246* | Monte Agraço |
Gradil | 1519, Out. 1 | 246 | Gradil |
Enxara dos Cavaleiros | 1519, Nov. 20 | 253v-254 | Enxara dos Cavaleiros |
*O registo do foral de Monte Agraço está errado na data do foral, pois indica 20 de Outubro de 1519.
Além das informações sobre a filiação ou modelo seguido pelos diversos forais, o registo informa-nos sobre o número de folhas dos originais e, no título, sobre o foral velho que foi reformado ou se o foral novo foi dado por inquirições, sentença ou composição (acordo).
Foral | Dado | Título no registo / base do foral |
Torres Vedras | 1510, Junho, 1 | Foral da vila de Torres Vedras dado por El-Rei D. Afonso, conde Bolonha |
Vila Franca | 1510, Junho, 1 | Foral da vila de Vila Franca de Xira, dado por Dona Froila |
Castanheira | 1510, Junho, 1 | Foral das vilas de Castanheira e Povos dado por El-Rei D. sancho, o primeiro |
Alenquer | 1510, Junho, 1 | Foral da vila de Alenquer dado pela infanta Dona Sancha |
Mafra | 1513, Julho, 1 | Foral de Mafra per inquirições |
Ericeira | 1513, Ago. 31 | Foral da vila da Ericeira dado pelo mestre de Avis |
Aldeia Galega | 1513, Out. 1 | Foral de Aldeia Galega per o fora de Alenquer |
Vila Verde | 1513, Out. 1 | Foral de Vila Verde per composição entre o senhorio e o povo |
Sintra | 1514, Out. 29 | Foral para a vila de Sintra |
Cascais | 1514, Nov. 15 | Foral da vila de Cascais dado por El-Rei D. Afonso Henriques e D. sancho, seu filho. |
Colares | 1516, Nov. 10 | Foral da vila de Colares dado por El-Rei D. Dinis |
Cheleiros | 1516, Nov. 25 | Foral da vila de Cheleiros dado por El-Rei D. Dinis |
Arruda | 1517, Jan. 15 | Foral da vila da Arruda |
Monte Agraço | 1518, Nov. 20 | Foral do Reguengo de Monte Agraço do Bispo de Évora, dado pelas inquirições |
Gradil | 1519, Out. 1 | Foral do Reguengo do Gradil, das capelas de El-Rei D. Afonso, dado pelas inquirições |
Enxara dos Cavaleiros | 1519, Nov. 20 | Foral da Enxara dos Cavaleiros, dado pelas Inquirições |
5. Os diferentes tipos de foral, quanto à página de rosto
Entretanto, se o foral ainda não estivesse concluído, quer quanto às iluminuras quer quanto à encadernação, tratava-se de o completar. Quer no foral de Torres Vedras, quer nos outros da região, dados em 1510, as iluminuras têm a mesma data, nas eclípticas das esferas armilares. Mas conhecem-se casos de forais, cujas iluminuras só foram concluídas alguns anos depois (p. ex. Ericeira 1513 – 1514). Mais frequentes são os casos de forais cujas iluminuras apresentam datas anteriores à outorga do foral, por vezes com muitos anos de diferença (Óbidos 1506-1513, Sintra 1508-1514). Este desfasamento poderá explicar-se por problemas surgidos durante o processo de preparação que atrasaram a feitura do foral, ou então que houvesse páginas rosto previamente preparadas pelos iluminadores para os vários tipos de foral. Esta hipótese é reforçada pela existência de vários exemplares de forais (em diversas as comarcas) muito semelhantes no seu frontispício e com as datas de 1506 e 1508 nas eclípticas. É de supor que, com tão elevado volume de trabalho na Chancelaria, a feitura dos forais fosse, de certo modo, um trabalho de equipa e em série.
Foral | Dado | Eclípticas | Castelos |
Lisboa | 1500 | —- | 11 |
Santarém | 1506 | —- | 8 |
Óbidos | 1513 | 1506 | |
Atouguia | 1510 | Signos do Zodíaco | 7 |
Torres Vedras | 1510 | 1510 | 9 |
Vila Franca de Xira | 1510 | 1510 | 9 |
Ericeira | 1513 | 1514 | 7 |
Sintra | 1514 | 1508 | 7 |
Montemor-o-Velho | 1516 | R.P.G. | 9 |
Executada a iluminura, procedia-se à encadernação, sendo muito poucos os casos conhecidos de forais que não chegaram a ser encadernados.
O foral estava agora pronto para ser entregue ao concelho e anunciado publicamente, mas era necessário que a câmara e o senhorio efectuassem o pagamento dos custos com a feitura do foral que lhes era destinado. A entrega e publicação eram feitas numa cerimónia própria, cujo auto ficava, em regra, registado no foral.
Tipos de foral
Tendo em consideração as características da página de rosto, foi apresentada por Ana Maria Alves, em 1985, na obra Iconologia do Poder Real no Período Manuelino, uma proposta de classificação dos forais em 3 tipos (do mais simples para o mais artisticamente elaborado):
1º tipo – Forais com cercadura uniforme para toda a página e com a letra D (de Dom Manuel) em tamanho grande e ornamentada no interior com motivos filigranados.
2º tipo – Forais com separação entre a cabeça da página e o texto, marcada pela maiúscula e pelo espaço que a envolve. O D apresenta no seu interior as armas reais, geralmente com escudo de 7 castelos e coroa de 5 pontas.
3º tipo – Forais com divisão da página em três partes: a superior com o escudo real (9 castelos, em geral) ao centro entre duas esferas armilares; a média, constituída por uma tarja larga com o nome do Rei; a inferior com a caixa de texto rodeada pela cercadura.
Em 1990, no estudo “Os Forais de D. Manuel 1496-1520“, Maria José Mexia Bigotte Chorão deu a conhecer um alvará de 1504 que referia três tipos de forais, consoante a importância dos lugares:
1º – os forais dos “lugares principais”, “com esfera da divisa dourada”
2º – os forais de “outra sorte meã de lugares”
3º – os de “terceira ordem”.
O documento de 1504 indica 45 lugares principais; 32 intermédios e 80 de terceira ordem, num total de 157, portanto uma lista bastante incompleta, muito longe dos cerca de 570 forais atribuídos.
Tendo em conta a classificação proposta por Ana Maria Alves e a lista de lugares de 1504, José Manuel Garcia e Francisco Ribeiro da Silva, em 2001, na obra “Forais Manuelinos do Porto e do seu Termo”, propuseram que se invertesse a ordem proposta por Ana Maria Alves, para assim fazer coincidir os forais do 1º tipo com os lugares principais e os de 3º tipo, com os lugares de 3ª ordem. Trata-se de uma proposta lógica que pode servir como ponto de partida para um estudo mais pormenorizado dos forais manuelinos, no que se refere às suas características formais.
Mais recentemente, José Manuel Garcia, Os Forais Novos do Reinado de D. Manuel (2009), reformulou a sua proposta, considerando não tanto um critério assente nas características formais, mas sobretudo a sequência cronológica, pois os forais de tipo 3 da sua proposta anterior são em geral, mais antigos do que os forais de tipo 2, pelo que trocaram de posição na nova proposta. Por comodidade de exposição, adoptamos a sua proposta anterior.
Se houve uma intenção inicial de fazer corresponder os tipos de foral à categoria do lugar, observa-se que foram muitas as excepções. Logo numa primeira análise aos forais conhecidos, verifica-se não haver sempre correspondência entre o tipo de foral e a categoria do lugar. Há que recorrer a outros critérios indicativos sobre a importância dos lugares, como são por exemplo, a sua categoria ou estatuto e, principalmente, o lugar que ocupavam nas Cortes[18].
Sintra era um lugar meão na lista de 1504, mas ocupava o 6º banco nas Cortes, ao lado de Torres Novas, Castelo Branco e Aveiro. Teve foral como lugar principal.
Colares não consta da lista de 1504, nem tinha assento nas Cortes, teve foral de tipo 2.
Atouguia e Soure, nas mesmas condições de Colares tiveram foral do tipo 1
Tipologias de forais da comarca de Torres Vedras
Foral | Tipo | Censo de 1527 (Nº fogos) | Lista de 1504 (categoria do lugar) | Lugar nas Cortes (séc. XV) |
Castanheira e Povos | 1 | 233+76 | ——— | ———- |
Ericeira | 1 | 75 | ——— | ———- |
Sintra | 1 | 1038 | Lugar meão | 6º banco |
Torres Vedras | 1 | 1943 | Lugar principal | 7º banco |
Vila Franca de Xira | 1 | 337 | ———- | ———- |
Cascais | 2 | 482 | Lugar de 3ª ordem | ———- |
Colares | 2 | 204 | ———– | ———- |
Mafra | 2 | 191 | ———– | ———- |
Monte Agraço | 2 | 61 | ———– | ———- |
Pode concluir-se que as indicações constantes da lista de 1504 não foram seguidas, pois há lugares meãos e de terceira ordem com forais do 1º tipo (Sintra, Cascais). E observa-se também que não era necessário estar representado nas Cortes, nem constar da lista para ter um foral do 1º tipo (caso de Castanheira e Povos, Ericeira, Vila Franca de Xira). Assim, não parece ter havido uma normativa ou critério uniforme para a opção pelos diferentes tipos de foral ou, a ter existido inicialmente, não foi observada. Põe-se a hipótese de alguns concelhos e senhorios, com condições para pagarem forais de tipo 1 (mais caros devido à iluminura e à encadernação) e por razões de importância e prestígio, terem conseguido essa distinção[19].
Se fizermos uma análise mais pormenorizada dos 3 tipos principais de frontispícios, vamos detectar algumas variantes ou subtipos.
Assim, nos forais genericamente considerados de tipo 1, destacam-se alguns que podemos considerar de aparato: Lisboa, Santarém, Coimbra, Évora, Porto, Bragança, Setúbal. Observam-se também tipologias que podemos considerar regionais, caso de vários forais do Algarve, com uma serpente alada a formar o D de D. Manuel, ou uma série de forais da Estremadura, nos quais se inclui o de Torres Vedras, com características muito idênticas (Abrantes, Castanheira e Povos, Vila França de Xira). São raros os forais com a representação das armas das armas da vila ou cidade (Porto, Coimbra, Tavira, Lagos). Também muito raros, os que ostentam os brasões dos senhorios (Lugares do Bispado de Coimbra na Comarca da Estremadura, id. na comarca da Beira, armas plenas de D. Jorge de Almeida; Lugares do mosteiro de Santa Cruz no termo de Montemor-o-Velho, armas de D. Pedro Gavião, prior do mosteiro).
Tanto os 4 forais do tipo “Torres Vedras” (todos atribuídos em 1 de Junho de 1510), como os forais de outros subgrupos tipológicos (forais com corujas, grandes borboletas, cravinas brancas, rosas brancas) devem ter sido preparados na mesma oficina, ou pelo mesmo iluminador. E, nos casos que designamos por do tipo “Torres Vedras”, também escritos pelo mesmo calígrafo. Os forais de Leiria e de Torres Novas são muito semelhantes na iluminura, mesmo nos pormenores. O de Atouguia é idêntico ao da Ericeira, com uma diferença: o primeiro tem os signos do Zodíaco nas eclípticas, o segundo a data de 1514.
Quanto aos forais de tipo 2, podem também agrupar-se em vários subtipos, considerando a cercadura mais ou menos larga, a falta de cercadura na margem inferior (caso de Colares), a disposição do início do texto. Da família de Colares, temos por ex. Mogofores, Pavia, Santa Comba, Vacariça e Mealhada, Vimioso. Com um filigranado muito idêntico na cercadura são os forais de Cascais e de Alcanede e Pernes. Já para o foral de Monte Agraço não se lhe conhece outro análogo.
Nos forais de tipo 3, podemos distinguir dois sub-tipos: um com cercadura completa (Aveiras de Cima, Cadaval; outro com tarja (Amieira, Chacim, Frechas, Nisa)[20].
Outro aspecto que importa referir nos forais dos tipos 1 e 2 é o número de castelos representados no escudo real. O mais frequente são nove castelos nos forais de tipo 1 e sete castelos nos forais de tipo 2. Excepções no tipo 1 são os forais de Ericeira e Sintra, com sete castelos.
4. Custos de feitura. Encadernação, dimensões, número de fólios
Os forais só eram entregues às câmaras e aos senhorios dos lugares depois de ser efectuado o pagamento dos custos da sua feitura. O custo dos forais dependia do tipo de foral (iluminura, encadernação), da qualidade do pergaminho (da “terra” ou da “Flandres”) e do nº de fólios e de parágrafos.
Observam-se dois tipos de encadernação que, em geral, correspondem aos tipos de foral:
Tipo A – encadernação com esferas armilares nos cantos e o escudo real ao centro.
Tipo B – encadernação com cinco brochas boleadas
Não se verifica uma correspondência directa entre o tipo de foral e as suas dimensões e encadernação, embora de modo geral se observe que os forais do 1º tipo e com encadernações do 1º tipo tinham, por norma, dimensões maiores que os outros. Já o número de fólios tinha mais a ver com o conteúdo e particularidades do foral do que com a importância da respectiva vila (p. ex.: o foral de Cascais é mais extenso do que o de Torres Vedras, sem porto de mar).
A maioria dos forais da Estremadura e das outras comarcas não tem registados os custos e está por fazer um inventário daqueles que os apresentam. Ainda assim, no que respeita aos forais da comarca de Torres Vedras, chegou até nós um número razoável de forais com indicação dos respectivos custos:
Tipos de foral, encadernação, dimensões e custos
Foral | Tipo de foral | Enca- dernação | Dimensões | Nº de fólios do texto | Custos |
Castanheira e Povos | 1 | A | 300×210 | 15 fls. | —— |
Ericeira | 1 | B | 315×205 | 11 fls. | 1500 reais |
Sintra | 1 | * | 280×198 | 22 fls. | 1252 |
Torres Vedras | 1 | A | 295×200 | 15 fls. | 2680 |
Vila Franca de Xira | 1 | A | 295×200 | 14 fls. | 2680 |
Cascais | 2 | A | 230×233 | 22 fls. | 1244 |
Colares (câmara) | 2 | B | 280×200 | 11 fls. | 853 |
Colares (senhorio) | 2 | [B]* | 280×200 | 11 fls. | [853] |
Mafra | 2 | * | 300×205 | 11 fls. | ——- |
Monte Agraço | 2 | B | 240×180 | 15 fls. | 903 |
*Não conservaram a encadernação original, nem foram reencadernados aproveitando os ferros.
No cálculo dos custos, havia algumas despesas fixas, como por exemplo o preço do selo de chumbo e a verba para o porteiro.
No início da reforma, houve uma tabela (30 de Agosto de 1504)[21] que fixava os preços que se deviam levar pelos forais, tomando como referência os de Lisboa (2680 reais) e o de Évora (2150 reais) e com variações, dependendo do tipo de pergaminho, encadernação e iluminura. Ao que parece, essa tabela de referência foi abandonada por volta de 1515, altura em que foram publicados regimentos específicos para cada comarca sobre o modo de “lançar” (entregar e publicar, recebendo o respectivo pagamento). O foral de Torres Vedras, bem como o de Vila Franca de Xira, ainda foram pagos segundo essa primeira tabela, custando cada um os mesmos 2680 reais do foral de Lisboa. Como nenhum deles tem registado o auto de entrega e publicação, deduz-se que tenham sido entregues antes da publicação do regimento de 1515. Concorre para essa dedução, o facto de o recebimento dos custos desses forais ter sido feito por Afonso Mexia, escrivão da Fazenda Régia, que estivera em S. Jorge da Mina como feitor, entre 1511 e 1513, e cuja presença em actos públicos no continente se voltou a documentar desde 10 de Março de 1513[22].
O registo dos custos do foral de Cascais dá-nos algumas informações adicionais sobre este aspecto ainda tão pouco estudado: “Monta nos custos deste foral 1244 reais, a saber: 1074 que vale o outro seu parceiro pelas adições nele escritas e 170 reais que este vale mais pelas armas e esferas que tem. 1244 reais”. Informa-nos este registo que o exemplar da câmara custou mais 170 reais do que o exemplar do senhorio, por ter algumas adições escritas e, principalmente, pelos elementos metálicos da encadernação com as esferas armilares e armas reais.
Nos exemplares do foral de Colares, só o da câmara) tem registados os custos: 853 reais. Todavia, na mesma folha encontra-se uma nota que nos informa ter sido também esse o custo do exemplar do senhorio: Ut in allio (o mesmo no outro).
Como o registo dos custos não está pormenorizado em parcelas, podemos calculá-lo de forma muito aproximada recorrendo a um foral do mesmo tipo, dimensões e encadernação em que os custos estão discriminados, como é o caso do Foral de Canha, dado também em 1516:
Letras – 37 reais; Parágrafos – 30 reais; Folhas brancas – 143 reais; Folhas escritas – 216 reais; Chancelaria e porteiro – 110 reais[23]; Encadernação – 120 reais; Guarnição – 80 reais; Rosto – 150 reais (Total – 886 reais).
5. Autos de publicação
Os forais, como leis particulares que eram, só passavam a ter valor de lei perante as comunidades a que diziam respeito depois de serem apresentados publicamente e entregues às respectivas câmaras. Assim, a aplicação do foral só se tornava efectiva depois da sua publicação, a qual podia demorar vários anos. Por ausência de documentação, ignoramos quase tudo sobre os procedimentos para a entrega e publicação dos forais num largo período entre 1500 e 1515, altura em que começam a surgir com regularidade os registos dos termos de entrega às câmaras e aos senhorios.
Anteriores a 1515, apenas se conhecem referências às entregas dos forais do Algarve (1504, depois de 14 de Setembro), Beja (1512, Março, 6)[24] e Santarém (1512, Julho, 4).
A entrega e publicação tinha lugar durante uma cerimónia própria, cujo auto ficava, em regra, registado no foral. A entrega era feita às autoridades concelhias e ao representante do senhorio por um representante do Rei, quase sempre um oficial da Fazenda. O foral era lido por um tabelião ou pelo escrivão da câmara que de seguida procedia ao seu registo, sendo este assinado pelos presentes.
No que se refere aos forais da comarca de Torres Vedras, apenas conhecemos os autos de entrega e publicação dos forais da Ericeira e de Sintra. Para o conjunto da Estremadura, identificamos 32 autos de publicação[25], efectuados quase na totalidade nos anos de 1516 e 1517. Observa-se que correspondem, na maioria dos casos, a forais dados em 1514 e 1513. Supõe-se que os forais dados em 1510 (9 na comarca da Estremadura) já tivessem sido todos entregues antes de 1515, excepção feita ao primeiro foral de Abrantes (dado em 1510 e publicado em 1516).
AUTOS DE ENTREGA E PUBLICAÇÃO
DE FORAIS DA ESTREMADURA
Foral | Data de outorga | Data de publicação |
Santarém | 1506.02.01 | 1512.07.04 |
Aveiro | 1515.08.04 | 1516.09.01 |
Esgueira | 1515.06.08 | 1516.09.02 |
Serpins | 1514.02.27 | 1516.09.03 |
Cantanhede | 1514.05.20 | 1516.09.10 |
Ílhavo | 1514.03.08 | 1516.09.09 |
Anadia | 1514.08.21 | 1516.10.05 |
Vacariça e Mealhada | 1514.09.12 | 1516.10.05 |
Ançã | 1514.06.28 | 1516.10.09 |
Penacova | 1513.12.31 | 1516.10.19 |
Abrantes* | 1510.06.01 | 1516.11.14 |
Ericeira | 1513.08.31 | 1517.01.01 |
Alcoentre | 1513.09.26 | 1517.01.05 |
Sintra | 1514.10.29 | 1517.02.19 |
Coimbra | 1516.08.04 | 1517.08.22 |
Alcanede e Pernes | 1514.12.22 | 1517.01.06 |
Abrantes* | 1518.04.10 | 1518.07.07 |
Paus | 1516.06.02 | 1522.08.05 |
*O foral de Abrantes foi dado, registado e publicado duas vezes,
em virtude de questões levantadas pelo senhorio[26]
A entrega dos forais da comarca da Estremadura foi efectuada, a partir de 1516, por Brás de Ferreira, escudeiro e escrivão do Almoxarifado da Alfândega de Aveiro, que fora procurador dos Feitos dos Forais (referenciado desde 1499[27]) e teve depois a incumbência de fazer as entregas, mediante um Regimento específico que é mencionado nos termos de entrega, mas cujo teor original se desconhece.
Exemplo de auto de entrega e publicação, registado no exemplar da câmara (Ericeira):
Anno do nacimento de Nosso Senhor Jesu Christo de mil e quinhentos e dezassete anos, aos x dias do mês de Janeiro, na vila d’ Eiriceira, no paço do concelho, estando hy Afomso Anes, ouvidor, e Silvestre Anes, juiz, e Gonçalo Diaz, e Gonçalo Annes, vereadores, e procurador do concelho Pero Afomso, e outro povo, todos em camara, pareceo Brás de Ferreira, morador em Aveiro e mostrou hum regimento d’ El Rey, nosso senhor, que fala da maneira em que á-de deitar os foraes desta comarca d’ Estremadura e bem asy apresentou este foral que foy pobricado a todos e outro tal pera o senhorio, e este entregou logo ao juiz e oficiaes e requereo que o comprisem como El Rey nosso senhor manda, e que lhe pagassem mil e quinhentos reaes que se nele monta, e eles receberom o dicto foral e disseram que o pagariom o tempo que El Rey manda. Testemunhas: Álvaro Annes e Afomso Pirez, eu Álvaro Annes tabaliam sprivam da camara que esto esprevy.
(assinaturas): Afonso Annes, ouvidor; Gonçalo + Diaz; Silvestre + Annes; Gonçalo + Annes; Álvaro Annes; Álvaro + Meão, testemunha; Afonso + Pirez, testemunha.
Exemplo de auto de entrega e publicação registado no foral (Sintra) destinado ao senhorio (Rainha):
Anno do nacimento de Nosso Senhor Jesu Christo de mil e xbij annos, dezanove dias do mês de Fevereiro, na villa de Syntra, nas casas de Fernam de Lemos, cavaleiro da Casa d’ El Rey,, noso senhor, estando hy os honrados Joham Lopez, escudeiro da [Raynha nosa senhora] e Nuno Martins e Joham Gaguo, outrosy escudeiro [ e Fernão] de Lemos, almoxarife da Raynha, nosa senhora, doente em huma cama, pareceo hy Brás de Ferreira, morador em Aveyro e amostrou hy um regimento d’ El Rey, noso senhor, em como se aviam de lançar os foraes nesta comarca da Estremadura e bem asy apresentou este forall que loguo hy foi povricado e o emtregou ao dicto almoxarife e lhe requereo que o comprise como se nelle contém e lhe pagase mil e duzemtos e Lij reaes que se nelle monta. E o dicto almoxarife o recebeo e dise que lhe pagaria o [dicto foral]. (assinaturas): Joham Gago, Fernam de Lemos, Joham Vasquez.
6.Vistos de correição
Os vistos de correição deviam ser efectuados anualmente pelo corregedor da Comarca respectiva na época, o qual verificava o estado de conservação do foral, se tinha havido alterações (rasuras, emendas) ao texto e, de modo geral, se estava a ser cumprido. As correições efectuaram-se desde a publicação dos forais até á sua abolição e reforma por Mouzinho da Silveira em 1832-34.
As correições eram efectuadas sem aviso prévio, havendo registos efectuados em todos os meses do ano. Todavia, as inspecções aos forais nem sempre eram feitas uma vez por ano, como estava determinado, sendo muito irregulares, a julgar pelos registos que se conservaram. São muito raros os registos de vistos de correição ainda no século XVI, tornam-se mais frequentes no séc. XVII e bastante numerosos no séc. XVIII. Por exemplo, o foral de Cascais apresenta apenas 7 vistos para um período de 1573 a 1785, enquanto o foral de Colares teve 37 vistorias entre 1647-1811.
Vistos de correição
Forais | Nº de vistos de correição | Datas limite | Provimento para treslado ou encadernação |
Castanheira e Povos | |||
Ericeira | 15 | 1624-1799 | |
Sintra | |||
Torres Vedras | 13 | 1639-1791 | Sim |
Vila Franca de Xira | 8 | 1708-1832 | Sim |
Cascais | 7 | 1573-1785 | Sim |
Colares (câmara) | 37 | 1647-1811 | Sim |
Colares (senhorio) | |||
Mafra | |||
Monte Agraço | 3 | 1625-1668 |
Geralmente, o corregedor anotava apenas: visto em correição, seguido do local, data e assinatura. No século XVIII, além do simples visto, surgem com frequência ordens para que se trasladasse o foral e para que se encadernasse. Em Vila Franca de Xira, na correição de 1708, o corregedor Bernardes determinou: “Este foral se mande logo encadernar e se valerão das mesmas pastas que andam avulsas, querendo. O que cumprirão logo e o contrário se dará em culpa”. No caso de Torres Vedras, em 1775, o corregedor Joaquim José Jordão mandou: “Observe-se e treslade-se e conserve-se na forma que nos capítulos de correiçam proverei”. Mais de uma década depois, em 1788, outro corregedor, Barreto de Mendonça, voltou a ordenar: “Mande-se logo encadernar este foral e se tenha em maior resguardo”. O mesmo corregedor tinha em 1785 (Setembro, 26) escrito no foral de Cascais: Visto em correição. Observe-se o provimento retro e se mande encadernar este foral e se guarde no Archivo da Camara.
Em Colares, por três vezes os corregedores tentaram que as suas determinações para se fazer uma cópia do foral fossem cumpridas, sem o conseguirem. Em 1774 (Setembro, 29), o corregedor Jordão deu o seguinte provimento: À custa do concelho se faça tirar uma cópia autêntica formal e de boa letra deste foral, conservando-se este interessante original no cofre da câmara, ficando deste modo provido a leitura fácil do que todos os dias serve ou pode servir aos casos ocorrentes e ao descaminho dele”.
Em 1796 (Outubro, 6), o corregedor Fialho renovou a determinação anterior: Visto o mau estado deste original e por anterior provimento que a câmara devia tão acauteladamente guardar e (….) que a falta do cumprimento retro por se não apresentar cópia autêntica ordenada nele, logo que no visto de correição se não apresentar (…) escrivão da câmara e vereadores (letra muito sumida) . Não surtiu efeito a recomendação e, em visto de correição de 1811, o último registado, o corregedor escreveu: mantemos o provimento.
7. A história dos códices
7.1. O exemplar do senhorio
Na maior parte dos casos conhecidos e estudados, são raros os forais de que se conservaram os dos dois exemplares (câmara e senhorio), sendo mais frequente terem-se extraviados os exemplares do senhorio.
O foral de Torres Vedras, do senhorio da Casa das Rainhas, andava em 1794 na posse do escrivão dos direitos reais, jugadas e reguengos de Torres Vedras. Desapareceu em 1834 no incêndio ocorrido na Provedoria de Torres Vedras.
O foral de Sintra estava em 1799 na posse de José Inácio da Silva Cordeiro que o entregou à câmara, onde não havia o seu original. Escreveu uma nota que se conserva apensa ao foral, em que diz tê-lo retirado do Cartório dos Direitos Reais e que o entregava à Câmara para não se arruinar ainda mais e para melhor servir.
O exemplar do senhorio do foral de Colares estava na posse de quem recebia os direitos reais.
Em data que não se pode precisar, finais do séc. XIX, entrou na posse de pessoa particular, ainda não identificada, e há notícia de, em 1938, se encontrar na Adega Regional de Colares: “Este precioso foral é hoje propriedade da Adega de Colares”[28].
Luis Keil (1881-1947)[29], filho de Alfredo Keil e que construiu na Eugaria o Casal da Serrana e muito interessado na história de Colares, refere-se ao foral de Colares numa carta a um amigo, dizendo que julgava o foral desaparecido desde 1865, pedindo-lhe que lho deixe copiar ou fotografar. É conhecido o rascunho dessa carta que escreveu no período em que foi conservador do Museu Nacional de Arte Antiga (1920-1931).
Este exemplar seria o primeiro dos dois originais do foral de Colares a integrar o acervo do Arquivo Histórico Municipal.
7.2. Exemplar da câmara
Com a extinção do concelho em 1855, o exemplar da câmara levou sumiço se é e que não tinha já sido retirado da arca do concelho logo depois da reforma dos forais em 1834. Assinale-se que o último visto de correição registado data de 1811.
Não se sabe como, mas o certo é que antes de 1884, o foral estava nos Açores e foi leiloado em Angra do Heroísmo, junto com outros livros do espólio de um tal Joaquim Mariano Rodovalho, cujas ligações a Colares desconhecemos. Foi adquirido por João Hermeto Coelho de Amarante (1820-1895), um erudito açoreano, que o vendeu em 1886 a António Borges de Medeiros Dias da Câmara de Sousa (1861-1908), Conde da Praia e de Monforte, depois marquês[30].
O Marquês da Praia tinha uma grande quinta na zona e em 1885 vendeu uma parcela ao seu amigo Carlos Mourato Roma que fez construir a Villa Roma.
Nada mais sabemos do paradeiro deste exemplar do foral até que, em 23 de Novembro de 2004, a câmara de Sintra o adquiriu num leilão em Lisboa.
8. Questões em aberto sobre o foral e sobre a história de Colares
8.1. Os mouros forros de Colares. O reguengo.
1170 – Foral dos mouros forros de Lisboa, Almada, Palmela e Alcácer
1255 – Foral de D. Afonso III. Almargem de Mauris. Reguengo de Colares.
1281 – Foral de D. Dinis
Sintra e Colares eram comunidades de cariz agrícola. A organização da comunidade rural não passava pela estrutura comunal, nem os seus membros viviam apartados numa mouraria.
Séc. XV – Ali de Colares, oleiro na mouraria de Lisboa em finais do séc. XV
Abraão Omar de Colares, idem., o que sugere imigração de alguns membros da comunidade muçulmana de Colares
1499 – A rainha D. Leonor recebeu 2480 reais correspondentes aos dois moios de pão terçado (farinha de trigo, centeio e milho miúdo) que rendiam os dízimos dos mouros de Sintra e de Colares”. O rendimento calculado em pão terçado é um indicador de antiguidade (séc. XII-XIII).
8.2. A criação do concelho, o estatuto de vila
1360; Fevereiro – Carta de confirmação dos privilégios dos moradores do Reguengo de Colares, termo de Sintra, etc. (Chanc. D. Pedro I, fl. 41)
1422 – Título dos besteiros da comarca da Estremadura
Lisboa | 300 |
Cascais | 20 |
Sintra | 20 |
Colares | 10 |
Cheleiros | 2 |
Arruda | 24 |
Vila Franca e Castanheira | 15 |
Alenquer | 25 |
Aldeia Galega da Merceana | 15 |
Torres Vedras | 50 |
Lourinhã | 10 |
Azambuja | 10 |
Não constam Ericeira, Mafra, Monte Agraço, Vila Verde, etc.
1428 – alcaide de Colares, Vicente Anes cf. António Caruna, citado por Maria Teresa Caetano.
1437, Julho, 13 – Testamento de Afonso Gonçalves. Em Collares, em o paço do concelho estando aí Afonso Anes, juiz ordinário em o dito logo, fazendo audiência. Igreja Paroquial de S. Martinho de Sintra, Pergaminhos avulsos, Pasta 1, nº2 (cf. transcrição de José Manuel Gonçalves, cit. Maria Teresa Caetano)
1457, Junho, 2 – Brás Anes, tabelião de Colares ( MSVFL Liv. 71).
1478, Dez. 31 – emprazamento da courela do Pelourinho, em Colares
Herdade do dito cerrado que é onde chamam o Pelourinho que parte com caminho que vai para o Covão e com caminho de Cabriz para o Penedo
MSVFL, Liv. 71, fl. 18-21
8.3. A criação da paróquia
A criação algo tardia da paróquia de Colares, posterior à criação do concelho, pode ter a ver com a forte sujeição à paróquia de S. Martinho de Sintra, por sua vez dependente do Cabido da Sé de Lisboa que detinha o padroado.
Há notícias no séc. XV de uma igreja de Nossa Senhora da Misericórdia, no perímetro urbano de Colares, possivelmente implantada no local onde foi escavada uma necrópole, e que terá antecedido a igreja de Nossa Senhora da Assunção, começada edificar em meados do séc. XVI.
Uma lápide sepulcral existente na igreja paroquial com data de 1560 foi transcrita por Cordeiro de Sousa (1959) que a considerou deslocada de outro templo, eventualmente da capela de Nossa Senhora da Misericórdia. Não é conhecida a data exacta da criação da paróquia que, a julgar pelos registos paroquiais terá ocorrido em 1558 ou 1559.
Entretanto, encontramos uma informação que confirma a criação da paróquia nessa altura e que refere as circunstâncias dessa criação.
Trata-se de um Breve da Sé Apostólica, datado de 12 de Março de 1563, por que consta que sendo erecta a capela de Nossa Senhora de Colares, na freguesia de São Martinho de Sintra, em igreja paroquial, com condição que teria um capelão pároco que os fregueses nomeariam ad nutum (livremente) e lhe pagariam e fabricariam a igreja, sem prejuízo do Cabido e pároco de São Martinho, aos quais ficariam os dízimos e direitos paroquiais, suplicaram os ditos fregueses ao Papa que o Cabido pagasse ao dito pároco ou ao menos lhes deixasse os direitos paroquiais, e o Papa cometeu a decisão desta causa ao Cardeal Infante [D. Henrique][31] (fl. 312) in Cabido da Sé, p. 174.
FONTES E BIBLIOGRAFIA
Fontes manuscritas
ARQUIVO MUNICIPAL DE SINTRA
– Foral de Colares (2 exemplares).
– Arquivo de João Martins da Silva Marques
– Cartas Históricas de Povoamento e Toponímia 1154, 1253, 1370 (J. M. Silva Marques, Consiglieri Martins, 1949).
ARQUIVO NACIONAL DA TORRE DO TOMBO
Gavetas
– Gaveta 20, mç. 11, nº 37 – s.d. – Minuta feita para os forais novos da Estremadura
– Gaveta 20, mç. 12, nº 41 – s.d. – Processo feito para o foral de Torres Vedras
– Gaveta 20, mç. 11, nº 34 – s.d. – Processo feito para o foral da Ericeira
– Gaveta 20, mç. 11, nº 3 – 1504, Julho, 27 – Processo feito para o foral novo da Vila de Alenquer
– Gaveta 14, mç. 6, nº 24 – 1515 – Minuta para o foral do reguengo de Monte Agraço
– Gaveta 20, mç. 11, nº 27 – 1516, Julho, 18 – Processo feito para o foral de Colares, Cheleiros e Arruda
– Gaveta 20, mç. 11, nº 24 – 1516, Outubro, 22 – Processo feito para o foral de Cheleiros
– Gaveta 20, mç. 11, nº 36 – 1518, Setembro, 10 – Processo feito para o foral de Enxara de Cavaleiros
– Gaveta 18, mç. 1, nº 9 – 1500, Julho, 4 – 1504, Julho, 16 – Libelo dos moradores de Cheleiros contra o senhorio da terra, D. Álvaro de Ataíde e acórdão no Juízo dos Feitos dos Forais.
Leitura Nova
– Livro 47, Forais novos da Estremadura
Chancelaria Régia
– Chancelaria de D. Afonso III, L. I, fl. 152v., 2ª col.
– Chancelaria de D. Dinis, Liv. 1, fl. 34, 2ª col e fl. 35, 1ª col.
ARQUIVO DISTRITAL DE LISBOA
– Registos Paroquiais, freguesia de Colares, Livro 1 Mistos (1559-1575)
ANTT – Chancelaria de D. João III: Doações. Liv. 11, fl. 158v – 159.
Fontes impressas
– Cabido da Sé. Sumários de Lousada. Apontamentos dos Brandões. Livro dos bens proprios dos reis e rainhas. Documentos para a história da cidade de Lisboa, Lisboa: Câmara Municipal, 1954.
– Ordenações Manuelinas. Edição fac-similada da ed. da Real Imprensa da Universidade de Coimbra de 1792. Lisboa : Fundação Calouste Gulbenkian, 1984.
– DIAS, Luís Fernando de Carvalho (1962) – Forais Manuelinos do Reino de Portugal e do Algarve, conforme o exemplar do Arquivo Nacional da Torre do Tombo de Lisboa. Estremadura. Beja; Edição de Autor.
– FREIRE, Anselmo Braamcamp, “Povoação de Estremadura no XVI século”, in Arquivo Histórico Português, VI, 1908.
– Ordenações del-Rei D. Duarte, ed. Martim de Albuquerque e Eduardo Borges Nunes, Fundação Calouste Gulbenkian, Lisboa, 1988.
Estudos
– ALVES, Ana Maria – Iconologia do poder real no período manuelino: à procura de uma linguagem perdida. Lisboa: Imprensa Nacional-Casa da Moeda, imp. 1985.
– CAETANO, Maria Teresa (2000), Colares, Câmara Municipal de Sintra.
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– CHORÃO, Maria José Mexia Bigotte – Os Forais de D. Manuel : 1497-1520. Lisboa: A.N.T.T., 1990.
– CHORÃO, Maria José Mexia Bigotte; GONÇALVES, José Manuel (2001), Foral de Colares, Sintra: Câmara Municipal, 2001.
– CHORÃO, Maria José Mexia Bigotte; GONÇALVES, José Manuel (2001), Forais de Sintra, Sintra: Câmara Municipal, 2001.
– COELHO, Maria Helena da Cruz – Foral de D. Manuel I a Santarém : estudo, transcrição e glossário. Santarém : Câmara Municipal, 2007.
– CRUZ, António (1970), “No V centenário de D. Manuel I”, in Revista da Faculdade de Letras. História, série I, vol. 01, pp. 1-76
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[1] CHORÃO, Maria José Mexia; GONÇALVES, José Manuel (2001).
[2] Aquisição efectuada em 23 de Novembro de 2004 por Joaquim Cardoso Martins, vereador, em representação da câmara.
[3] Excepto o foral de Alcoutim, dado em 1520.
[4] CRUZ, António (1970), pp. 1-76
[5] RIBEIRO, João Pedro (1812), pp. 70-71.
[6] ANTT – Livro dos Forais Novos da Estremadura, fl. 254.
[7] Cf. DIAS, João José Alves (1996), p. 211, 227.
[8] ANTT, Gav. 14-6-31
[9] ANTT, Gav.20-11-27, publ. CHORÃO, M.J.M. e GONÇALVES, J.M. (2001), pp. 109-110.
[10] ANTT, Gav. 18-1-9.
[11] ANTT, Gav. 20-11-24
[12] LOBO E SILVA, Jaime de Oliveira (1985), pp. 31-32.
[13] ANTT – Gavetas: XX-11-27.
[14] ANTT – Gavetas: XX-11-24.
[15] ANTT – Gavetas: XIV-6-24.
[16] ANTT – Gavetas: XX-11-36.
[17] O foral de Colares não conservou o seu selo de chumbo. São, aliás, muito raros os que o conservaram (p. ex.: Arouca, Alcanede e Pernes, Mões, Alfaiates).
[18] São raríssimos os lugares representados em Cortes que não tiveram foral do tipo 1 (Valença- tipo 2, Nisa- tipo 3).
[19] Por exemplo: Castanheira e Povos (senhorio D. António de Ataíde); Atouguia (D. Afonso de Ataíde); Ericeira (João de Sousa); Soure e Vila Franca de Xira (Rei/Ordem de Cristo).
[20] Nenhum exemplo conhecido deste tipo na comarca de Torres Vedras, nem mesmo em toda a Estremadura.
[21] ANTT – Gavetas: XX-10-6
[22] LOUREIRO, Sara (2006).
[23] Da verba de 110 reais, 50 eram para o chanceler-mor e 60 para o porteiro, como se comprova por outros registos (Alhos Vedros, Alcochete, Lousã)
[24] O foral de Beja, não registado no Livro dos Forais de Odiana, seria objecto de uma segunda publicação, em 17 de Fevereiro, já de acordo com as instruções do Regimento entretanto publicado.
[25] Calculamos que existam cerca de 40 a 50 registos de autos nos originais que chegaram até nós, de toda a comarca da Estremadura.
[26] SILVA, Joaquim Candeias (2010 ).
[27] PINTO, Pedro (2015), p. 155.
[28] SANTOS, Raul Esteves dos (1938), p. 13.
[29] Vd. Tradição das Festas do Penedo, O Império do Penedo, 1900/1917; Transcrição datilografada feita por Luís Keil sobre Colares e Alcácer – Kibir – “A História de um mártir e de um documento”. MAS/Espólio de José Alfredo.
[30] Informações que constam duma nota apensa ao foral.
[31] Cabido da Sé. Sumários de Lousada. Apontamentos dos Brandões … (1954), p. 174.