À conversa com Diego El Gavi, um artista cigano, genuíno intérprete do Flamenco que se canta em Portugal, e com ligações pessoais e artísticas a Sintra
Diego, fale-nos um pouco das suas origens e do seu percurso pessoal
As minhas origens já são conhecidas do público geral, sou de etnia cigana. O meu percurso como pessoa e como músico: trato sempre de aprender o máximo possível com outras culturas, e, sobretudo, no quotidiano, aí donde se aprende e se saboreia muito do que sei hoje. Respeito muito as minhas tradições, mas quero mais para evoluir como ser humano isso faz de todos nós muito mais sábios
Sabemos que a sua vinda para Sintra em 2009 marcou uma evolução na sua carreira. Fale-nos um pouco dessa experiência.
Bem, aí é que está, nasce mesmo, porque como qualquer arte, não se pode obrigar as pessoas a gostarem do que não querem…em mim, particularmente, a minha mãe diz que de muito pequeno já fazia de um pau de vassoura guitarra, e cantava para a minha gente, agora se eles gostavam, não sei, o Flamenco é uma coisa que em minha casa era normal, ouvia desde pequeno, é a nossa música, e a nossa cultura, obviamente, depois, com a idade, vais separando o que gostas mais, e que estilo, mas aí, já são gostos.
O Diego tem atuado em muitos lugares, particularmente em Lisboa, nos últimos tempos. Como tem sido a experiência?
É verdade, eu já tocava, mas nada profissionalmente, mais por gozo, mas através da comunidade cigana de Sintra foi me dado a conhecer um músico de Sintra, um guitarrista que eu pensei que fosse um disco que estivesse a tocar, e fiquei fã, era quase como um Wi-Fi, ouve uma conexão de imediato, até hoje somos inseparáveis, e agradeço desde já ao Paulo Croft pelas horas perdidas, de tantas fadigas, e de tantas horas de ensino. Foi um dos que fez o nome Diego ter credibilidade dentro do Flamenco português, como eu costumo dizer, foi o meu fiel escudeiro. Depois, tive a sorte de conhecer o senhor Ricardo Pinto, artista de Sintra, também esse foi quem transportou o Flamenco a outras sonoridades, como o jazz, e outras mais.
O Diego tem atuado em muitos lugares, particularmente em Lisboa, nos últimos tempos. Como tem sido a experiência?
Sim, graças a Deus tenho tocado muito, sobretudo nos últimos 3 anos, e com companheiros de luxo, que sempre estão aí para me ajudar. Agora com esta situação do covid, menos, mas não me posso queixar, porque tenho visto relatos de colegas que não tem nada, infelizmente, e vejo como é difícil, porque todos nós temos contas para pagar, e é muito duro.
Diz-se que já cantou para Madonna. Como surgiu essa hipótese, e que memórias guarda dela?
Na verdade, ela já me tinha visto um par de vezes, em algumas festas particulares onde cantei, e através do produtor do meu disco, Ricardo Lopes, e também do percussionista que costuma tocar connosco, foi-nos feito o convite para cantarmos no seu aniversário, em Marraquexe. Foi mágico, obviamente não é todos os dias que se canta com uma diva, e depois, sermos a surpresa do aniversário, foi para mais tarde contar aos netos.
Fale-nos do seu disco “Puerta del Alma”
Bem PUERTA DEL ALMA tem tanto para contar que nem sei por aonde começar. Não é fácil gravar um disco em Portugal, quanto mais de Flamenco, mas depois de tantas peripécias, ainda há gente que aposta e que gosta da música, e não vê só euros. Também só foi possível porque houve uma grande boa vontade e esforço de todos os que nele participaram, esses não há cachê que pague. É um disco muito simples, com arranjos fantásticos de todos os que tocaram, e com a direção musical do Maestro Victor Zamora. É um disco que explora várias sonoridades, como o trompete jazzistico do Pinto, a salsa do Zamora, com uma base Flamenca sempre presente da minha voz, e, depois, claro, com convidados incríveis, como o fadista Ricardo Ribeiro, num bolero, o Maestro Paulo de Carvalho num tema de sua autoria, feito para a etnia cigana, que eu acho lindo, e o artista também da terra Tatanka, num pop Flamenco souleria
Como se definiria enquanto cantor?
Cantor de Flamenco, sempre, é a minha escola, mas não me gosto de fechar a novas interpretações, se gostar do som e me identificar, não me importo, seja ele que estilo for, atiro-me de cabeça.
Tem colaborado igualmente com o Tatanka, outro artista de Sintra. Como se conheceram e como foi essa experiência?
O Tatanka já o conheço há muitos anos, e conheci-o num estúdio de um amigo em comum. Eu estava a ensaiar, e ele bateu-me à porta, e disse-me com a espontaneidade que só ele tem: tenho ali um tema para o qual gostava que metesses vozes, e eu ri-me e ouvi, adorei, e desde aí criámos uma amizade grande. Já participei em alguns concertos dele a solo, e fiz um tema do primeiro disco dele, Pouco Barulho.
E como vê a vida cultural e artística de Sintra? Quer destacar alguns nomes ou eventos que o tenham marcado?
Eu gosto muito de Sintra, apesar de já não viver lá, tenho grandes recordações, porque foi em Sintra que comecei e já há algum tempo que lá não toco, mas já passei pelo Olga Cadaval algumas vezes, eu acho que Sintra tem sítios fantásticos para se fazer eventos, e aproveitar mais a vila de Sintra, pois tem grandes músicos a viverem no concelho. Acho que Sintra está pobre em termos de concertos, não pode ser só Olga Cadaval. Sintra é linda, vamos aproveitar e fazer programação artística de concertos. Para o ano, falaram-me de um festival que estão a pensar fazer em Sintra, é uma coisa lindíssima, se for para a frente o meu nome vai lá estar, vamos ver.
Qual a sua agenda para os tempos mais próximos?
Bem, agora é que são elas, tenho um concerto marcado em Colares, através dos antigos alunos da escola secundária da Portela, tenho todas as quintas dos próximos meses até dezembro em Lisboa, no Príncipe Real, depois, uma vez por mês, concertos no átrio do Tagus Park, tenho uma vez por mês uma data fixa aos domingos na Fábrica do Braço de Prata, o Capitólio, no dia 18 novembro, Dia Mundial do Flamenco, e mais coisas que vão aparecendo, isto é, se o vírus nos deixar…
Um sonho que gostasse de ver realizado
Neste momento, muito sinceramente, uma vacina para que este pesadelo desaparecesse, porque está a ser muito difícil passar este mau bocado. Que Deus me dê saúde para continuar a trabalhar e depois logo se vê. Queria agradecer à associação Alagamares pela entrevista, e espero estar ainda este ano num concerto com a vossa presença.
Abaixo, uma atuação de Diego El Gavi
Entrevista de Fernando Morais Gomes