A Quinta do Relógio é um antigo palacete fronteiro à Quinta da Regaleira, repleto de plantas raras e exóticas, como camélias, magnólias, araucárias, fetos, fúcsias e grandes nenúfares que cobrem os lagos da quinta.
A entrada do palácio é ladeada por dois edifícios baixos, e a fachada é pintada por faixas transversais e ornamentada geometricamente com inspirações neoárabes. Na fachada ainda se pode ver várias legendas árabes repetidas três vezes, que significam «Deus é o único vencedor».
A quinta foi adquirida a um padre jerónimo, pelo 15º Conde do Redondo, D. José de Sousa Coutinho (1789-1863), sendo mais tarde adquirida pelo milionário Metznar, que construiu a primeira casa na Quinta do Relógio, uma torre com sinos que dava horas ao som de vários minuetes. Esta casa foi entretanto demolida.
A propriedade foi mais tarde adquirida por um banqueiro de nome Thomas Horn, e em 1835 por Manuel Pinto da Fonseca, um negociante rico e traficante de escravos conhecido como «Monte Cristo», denominação retirada do conhecido romance de Dumas publicado em 1846, por ter enriquecido à custa dos escravos. Manuel Pinto da Fonseca entregou o projecto da casa a António Manuel da Fonseca Júnior. Em 1886 foi o palacete usado para a lua-de-mel de D. Carlos de Bragança e D. Maria Amélia de Orleans, futuros reis de Portugal. D. Maria Amélia comentou na época que “mais vale a sobreira dos fetos do que Cascais e Estoris, tudo junto».
Conta-se que, um dia o rei D. Pedro V passando diante da casa na companhia do marquês de Sá da Bandeira, este último, ouvindo a doce melancolia de um repuxo, lhe terá perguntado: «Senhor, o que é este barulho?». «-certamente a água» « Não, senhor, é o sangue dos negros flagelados pelo chicote que este homem transformou em ouro».
O poeta inglês Robert Southey (1774- 1843) foi inspirado pela imponência de um antigo sobreiro na quinta: «Há (…) aqui uma árvore tão grande e tão velha que um pintor deveria vir de Inglaterra só para a ver. Os troncos e os ramos são cobertos de fetos, formando com a folhagem escura da árvore o mais pitoresco contraste»
Christopher Berglund é um sueco apaixonado por Sintra e actual dono da Quinta do Relógio, pelo que falámos com ele sobre os planos que tem para a Quinta, e sobre o futuro do turismo em Sintra.
Christopher, desde quando é que a vossa família é proprietária da Quinta do Relógio?
Nós descobrimos que a quinta estava à venda em finais de 1997, e completámos a sua aquisição no Verão de 1998.
Têm planos para reconstruir o edifício primitivo e dar-lhe algum destino posteriormente?
A propriedade é composta de alguns edifícios diferenciados. Até agora, restaurámos a casa de hóspedes, e a maior parte do antigo jardim, que está já aberto ao público. No ano passado realizámos alguns trabalhos na casa dos antigos jardineiros e abrimos lá uma galeria, a Sintra Magic. Quanto ao edifício principal, terminámos a maioria do trabalho de escavações e reforçámos os muros de suporte. Presentemente, estamos a avaliar junto com a Câmara Municipal de Sintra o uso que o edifício poderá ter. Uma vez encerrado este processo, um projecto adequado poderá então ser aí desenvolvido.
Presentemente funciona uma galeria de arte numa zona dos jardins. O que fizeram desde que abriu, e que tipo de eventos esperam receber lá?
Fará em breve um ano desde que abrimos. Estamos a tentar atrair mais artistas, incluindo locais, de pintores a escultores. Presentemente, estamos a pensar organizar exposições temporárias, bem como manter a actual exposição fotográfica. Diferentes tipos de artesanato foram seleccionados e expostos na área da cafetaria. Estamos também a iniciar cursos de pintura e desenho, a ser ministrados por Michele Silva, nossa artista residente. A par disto, queremos organizar eventos musicais com natureza regular. O primeiro ocorreu a 31 de Maio passado, e foi dedicado ao jazz.
Durante as tardes de domingo de Junho teremos música de estilos diferentes, evento que, se vier a ser bem sucedido, se poderá tornar regular, pelo menos durante o Verão. Em função da época do ano, teremos concertos, lançamento de obras literárias, etc, ao longo do mês.
Há quanto tempo vive em Sintra, e o que acha dela e das pessoas de cá?
A primeira vez que vim a Sintra foi no início dos anos noventa, era ainda criança, e desde então apaixonei-me pelo país, pelo seu clima e gastronomia. Desde que adquirimos a Quinta do Relógio, passei a maior parte das minhas férias aqui, e quando terminei o liceu, vim para cá durante um ano, para aprender português. Foi desde 2004 que comecei a passar cada vez mais tempo cá, tendo em 2011 mudado para Sintra em definitivo.
Que projectos têm para os jardins, que abriram no passado dia 26 de Maio?
O jardim nunca esteve aberto ao público antes, e entendemos que, tendo parte da História de Portugal ali tido lugar, seria interessante que todos o pudessem sentir e vivenciar. Por exemplo, foi aqui que o rei D. Carlos e a rainha D. Amélia passaram a sua lua-de-mel, em 1886, três anos antes de serem coroados reis. Para já, começámos com passeios nocturnos, de quinze em quinze dias às sextas-feiras, pelas 22h. Estamos também a pensar fazer o mesmo durante o dia, com marcação prévia, dependendo da procura e do número de interessados. À medida que formos ganhando experiência, e consoante o feed back dos visitantes, assim iremos ajustando. Uma das ideias futuras, por exemplo, será a realização de teatro e eventos musicais nos jardins, e não só na cafetaria.
Em sua opinião, o que pode ser feito para melhorar o turismo em Sintra? O que acha que está bem e menos bem?
Penso que há diversos factores que, em conjunto, podem melhorar a experiência turística em Sintra. É necessário que Sintra seja vendido aos turistas como uma experiência. Com tantos castelos, edifícios históricos e uma natureza luxuriante, a experiência de um conto de fadas, ou de Capital do Romantismo, como lhe chama a Câmara de Sintra, deve ser a preocupação central. Deixe-se o visitante viajar mentalmente pela História e Cultura de Sintra. Quem aqui desenvolve projectos e negócios deve pensar em como torná-los únicos, e dessa forma tornar única a experiência.
Lembrem a herança da realeza, dos nobres, dos artistas, locais e estrangeiros, que por aqui passaram, e que são a grande base para o desenvolvimento presente e futuro de Sintra. Sejam ousados, e tentem algo novo, correndo o risco da inovação. O turista apenas pode experimentar o que nós lhe pudermos proporcionar.
Sintra não deve ser vista na perspectiva de uma visita rápida de um dia, antes como o momento principal de uma viagem. A estadia em hotéis durante pelo menos duas noites, aumentaria exponencialmente o número de eventos que aqui se poderiam fazer e ver. Com mais dormidas, terá igualmente de melhorar a oferta em restaurantes, bares e diversão, de modo que que a Vila não morra quando fecham os monumentos e os museus. É extremamente importante que se perceba que, havendo serviços de qualidade, haverá sempre pessoas dispostas a pagar por eles. Um cliente que parta com vontade de regressar, é o que todos desejamos.
Outra questão fulcral é a do trânsito. É bom ver que a CMS está a tentar novas soluções para o fluir do trânsito. Vejamos como resulta, e que se ajuste, se necessário. É uma tarefa de monta, e levará tempo, mas é necessário meter Sintra no bom caminho. Se estas questões básicas forem resolvidas, e surgirem os fundos necessários para o restauro do património, conjugado com celeridade na obtenção de licenças e autorizações, penso que Sintra pode voltar a ser um dos mais apetecíveis destinos turísticos do mundo. Temos todas as condições, só precisamos de polir o diamante que ainda está em bruto!