Entrevista com João Vicente

João Vicente  tem vindo a destacar-se entre a nova vaga de actores portugueses, tendo saído da “escola” sintrense que teve Rui Mário como mestre, e foi igualmente já membro duma direcção da Alagamares. Do seu trabalho destaca-se no cinema a sua participação em Tanto Para Andar Até Dormir (2013), realizado por Rui Esperança;Herança do Silêncio (2013), realizado por José Meireles ou Stagger Lee (2009), realizado por José Pedroso. Na televisão já o pudemos ver nas novelas  Mulheres, TVI, 2014;Sol de Inverno, SIC, 2013;Rosa Fogo, SIC, 2012;Historias para sempre, RTP 2, 2012, ou A Vida Privada de Salazar (2008) Valentim de Carvalho. Mas foi no teatro que começou, destacando-se a sua participação em Hamlet, de William Shakespeare. Mala Voadora. Encenação de Jorge Andrade, 2014;O Inimigo do Povo, de Henrik Ibsen. Comuna Teatro de Pesquisa. Encenação de Álvaro Correia, 2013;À Vossa Vontade, de William Shakespeare, Comuna Teatro de Pesquisa e Teatro Nacional D.Maria II. Encenação de Álvaro Correia, 2013;Do Amor Não Se Foge, de William Shakespeare. Palco 13. Encenação de Marco Medeiros, 2013;Sonho de Uma Noite de Verão, de William Shakespeare. Palco 13. Encenação de Marco Medeiros, 2012;Vermelho, de Jonh Logan. Teatro Aberto; Impressões, a partir de Jean Jacques Rosseau. Malaposta. Encenação de Mário Trigo, 2011;Retratinho de Guerra Junqueiro, de Alexandre Sarrazola. Teatromosca. Encenação de Mário Trigo, 2011 ; As Três Vidas, de Lucie Cabrol. Teatromosca. Encenação de Pedro Alves, 2010;Say it With Flowers, de Gertrude Stein. Ar de Filmes. Encenação de António Pires, 2009 LUX;Os Olhos do Mundo e a Fortuna, de John Herbert. Grupo 373. Encenação de José Henrique Neto, 2008. ESPAÇOKARNART e Teatro da Trindade;Loucos por Amor. Encenação de Paulo Lage, 2008. Teatro Taborda;Folia!, de Paulo Borges. Teatro Tapafuros. Encenação de Rui Mário, 2007;Era Uma Vez um Dragão, de António Manuel Couto Viana. Grupo 373.  Encenação de José Henrique Neto, 2006;Hamlet, de William Shakespeare. Teatro Tapafuros. Encenação de Rui Mário, 2006;Liberdade, Liberdade!, de Filomena Oliveira e Miguel Real. Teatro Tapafuros. Encenação de Filomena Oliveira, 2004;Suburbia Play Time Teatro Reticências, Encenação de Rui Mário, 2005;Verão de 1904 Teatro Tapafuros, Encenação de Rui Mário, 2004.

João, começaste a carreira ligado ao teatro em Sintra. Como surgiu o gosto pelo teatro, e o que destacas desse percurso?

O gosto pelo teatro foi surgindo. Comecei no grupo de teatro da Escola Secundária Leal da Câmara, o Reticências. O grupo é dirigido pelo Rui Mário que também dirige os Tapafuros. Foi assim que tudo começou, eu e um amigo meu, o José Redondo, decidimos entrar para o grupo. O Zé estava muito entusiasmado e eu nem por isso, mas acabamos por ficar e hoje somos os dois actores profissionais assim como alguns dos nossos colegas desse grupo. Ter estado neste grupo foi fundamental e muito especial, o Rui é de facto um grande mestre, ele consegue desenvolver um espírito de grupo muito forte, todos tínhamos um prazer enorme em fazer teatro naquele grupo. Nunca mais fiz teatro com aquele deslumbre, havia qualquer coisa que não se explicava, parecia aquilo a que as pessoas chamam magia do teatro, acho que foi no Reticências que eu estive mais próximo de perceber o que é essa magia. Depois profissionalmente comecei no Teatro Tapafuros também com o Rui Mário. Fiz dois ou três espectáculos e foi aí que percebi que queria ser actor a tempo inteiro. Concorri à Escola Superior de Teatro e Cinema e até agora não parei de trabalhar.

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Como vês a relação do público com o teatro hoje e nomeadamente como vês a apetência do público local pelo fenómeno teatral?

Hoje em dia é díficil definir um padrão, há muita coisa, muitas companhias com abordagens diferentes, com diferentes públicos. O teatro vai ter sempre uma vantagem em relação ao cinema e à televisão, pelo menos do meu ponto de vista é uma vantagem: o teatro não se grava, não podemos fazer downloads dos espectáculos, o teatro acontece no aqui e no agora, as pessoas ou vêm ou não vêm, ou vão ou não vão. Mas claro que é mais fácil e mais barato ir ao cinema, é mais confortável ficar em casa a ver televisão e séries na net. Mas ainda assim existe público para ir ao teatro, as pessoas procuram ir ver espectáculos, cada vez há mais meios de comunicação para divulgação, as redes sociais hoje em dia são fundamentais para divulgar os espectáculos. Claro que é díficil esgotar casas e há dias em que não há público. Entendo que a estratégia de divulgação é muito importante.

Que peças mais gostaste de representar e quais os que gostarias de representar como actor?

Gostei muito de fazer o espectáculo “Olhos do Mundo e a Fortuna”, pelo envolvimento que todos tivemos no projecto. Mais recentemente destaco o “Hamlet” com a Mala Voadora, não só pelo texto, mas pelo prazer que me deu trabalhar com aquelas pessoas que fizeram parte do projecto, foi um desafio motivante. Quanto a textos que gostasse de trabalhar há muitos, mas não consigo eleger nenhum.

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Tens feito incursões no teatro e televisão, o que te agrada mais e que características diversas encontras nos actores que só fazem teatro e os que foram moldados pelo fenómeno televisivo, sem pisar um palco?

Para mim é difícil generalizar, posso falar das minhas escolhas e daquilo que quero para mim. A verdade é que eu comecei no teatro, a mim interessa-me desenvolver o meu trabalho como actor, como intérprete. No teatro é mais “fácil” concentrar-mo-nos só nisso, estamos mais longe da projecção mediática, há tempo para experimentar e errar e só tendo tempo para errar é que podemos crescer e corresponder a desafios. Sinto que no teatro sou constantemente posto em causa e isso é viciante. Na televisão não há espaço para o risco, para o erro, o desafio é outro, o tempo está contado e joga contra nós. Na televisão temos de nos habituar a trabalhar com pouco tempo, com metas muito apertadas, para além da linguagem ser muito diferente da do teatro. A televisão vive muito do mediatismo dos actores e muitas vezes os actores vêem-se obrigados a trabalhar e a arranjar uma estratégia para esse lado mediático. O mediatismo é muito desgastante e volátil, para mim depender disso é impensável e é muito fácil o deslumbre pela fama e pelos luxos temporários que nos trás.
O teatro ainda funciona como uma voz ou um conjunto de vozes que têm coisas para dizer, para gritar. Não quero fazer com isto a apologia do teatro, porque o teatro pode ser também um espelho passivo da sociedade. Já a televisão tem sempre uma tendência para deixar tudo exactamente como está até que seja preciso pensar numa inovação que traga mais dinheiro.

O que poderia ser feito, em tua opinião, para dinamizar o fenómeno teatral e os espaços cénicos de Sintra?

Já saí de Sintra há dois anos, por isso a minha apreciação pode não ser muito justa em relação ao que se passa actualmente. As companhias em Sintra não têm tido as melhores condições para realizarem projectos contínuos, no entanto existe uma resistência por parte das companhias, não faz parte dos seus planos desistirem. A maior parte já passou por colaborar com espaços históricos de Sintra como é o caso da Quinta da Regaleira, do Palácio da Vila, o Parque da Liberdade e até Monserrate. Acho que esta colaboração é inevitável e tem trazido dinâmica às companhias e a Sintra.

Que conselhos darias a quem queira hoje enveredar por uma carreira no teatro?

Curiosidade e trabalho.

Quais são os teus projectos actuais e os mais próximos?

Neste momento estou no Teatro Aberto prestes a estrear um espectáculo chamado “Amor e Informação” de Caryl Churchil.

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AMOR E INFORMAÇÃO, da autora britânica Caryl Churchill, com encenação de João Lourenço e versão portuguesa de João Lourenço e Vera San Payo de Lemos.

Peça caleidoscópica, fora do vulgar, que propõe uma reflexão sobre o modo como lidamos com a informação, o amor, os afectos, a memória e a privacidade no momento presente, profundamente marcado pela tecnologia e pelas ligações digitais que se estabelecem na sociedade contemporânea.

ELENCO:Ana Guiomar | Carlos Malvarez | Cristóvão Campos | Francisco Pestana | Irene Cruz | João Vicente | Marta Dias | Marta Ribeiro | Melim Teixeira | Patrícia André | Paulo Oom | Rui Neto | Teresa Sobral

Do teatro que se tem feito em Portugal, queres destacar alguma peça em especial?

Não gostaria de destacar nenhum espectáculo em particular, mas destaco o trabalho das companhias Mala Voadora e do Teatro O Bando. Para mim são dois exemplos do que uma companhia deve ser, têm um trabalho criativo desafiante sempre com uma margem de risco alargada. Têm também projectos que vão para além dos espectáculos, há uma preocupação com o lado educativo e comunitário, colaboram com diferentes entidades nacionais e internacionais. Neste momento que passamos de saturação, de falta de soluções, de esgotamento de subsídios e de financiamentos é preciso virar o olhar para novas parcerias, novas formas de colaboração e de viabilização dos projectos, e parece-me que a colaboração além fronteiras é sem dúvida uma possibilidade cada vez mais forte e decisiva.

Fizeste já parte duma Direcção da Alagamares. Como vês o nosso trabalho e o que poderia ser feito quer na área da defesa do património, quer na promoção dos autores e artistas sintrenses, de que tu és um exemplo conseguido?

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Parece-me que a Alagamares tem feito um trabalho muito importante em Sintra, há uma preocupação constante em dinamizar actividades para promover Sintra junto dos sintrenses e dar a conhecer não só o património histórico, mas também o património criativo e artístico. Não sei que mais se poderá fazer, se calhar são precisas mais “Alagamares” em Sintra. Se calhar falta que cada associação descubra a sua verdadeira missão, a sua missão essencial.

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