A Alagamares recebeu da escritora Yvette Centeno um amável e inédito contributo poético, que muito agradecemos, registando a disponibilidade da autora para continuar a colaborar com quem faz da Cultura uma forma de ser e de estar.
Yvette K. Centeno nasceu em Lisboa, em 1940, numa família de origem germano-polaca. É casada, tem quatro filhos, e em sua casa a música e a literatura estiveram sempre presentes. Licenciou-se em Filologia Germânica com uma dissertação sobre O homem sem qualidades, de Musil, e doutorou-se com uma tese sobre A alquimia no Fausto de Goethe. É desde 1983 Professora Catedrática da Universidade Nova de Lisboa, onde fundou o Gabinete de Estudos de Simbologia, actualmente integrado no Centro de Estudos do Imaginário Literário. Ainda em estudante interessou-se por teatro, escreveu peças e rábulas, fundou o CITAC em Coimbra. Tem publicado literatura infantil, ensaio de investigação, poesia, teatro e ficção, com romances como Três histórias de amor (1994), Os jardins de Eva (1998) e Amores secretos (2006), tendo parte da sua obra traduzida em França, Espanha e Alemanha. Entre os autores que traduziu contam-se Shakespeare, Goethe, Stendhal, Brecht, Celan e Fassbinder.
CAIN
Mas afinal o que era
aquele pedaço de terra
de côr sangrenta
situado entre dois rios
não tinha gente
não podia ser país
Cain chegou ali
com as suas mulheres
roubadas pelo caminho.
Parou e disse
vou ter aqui os meus filhos
vamos erguer cidades
muralhas a rodear os templos
dos velhos deuses sagrados
vou fazer um país
Assim se fez,
mas reza a lenda
Cain
com a memória de Abel
não conseguiu ser feliz
Yvette K. Centeno
6 de Junho 2021
inédito