Ricardo Duarte
Habitualmente, quando procuramos Sintra nas referências literárias, somos levados para géneros diversos como Poesia, Ensaio, Romance ou Literatura de Viagens. Acontece que, em 1971 é dado à estampa em França, pela mão do ilustrador Jean Graton, um álbum de banda desenhada onde Sintra é tratada de uma forma visual e artística diferente do que estamos habituados.
Publicado em Portugal pela primeira vez em 1981, o livro “Rali em Portugal” (do original francês: 5 Filles Dans la Course, Dargaud editeur) a história relata a participação do herói Michel Vaillant na terceira edição do Rali Tap de Portugal, ocorrida em 1969. Esta prova automobilística, organizada pelo Grupo Cultural e Desportivo da TAP, começou por ser destinada a promover o convívio dos trabalhadores daquela empresa. O crescente interesse fá-la evoluir para prova internacional com a primeira edição em 1967. Três anos depois passa a integrar o campeonato europeu de Rali. Ora, amante também deste tipo de competições e sabedor da crescente evolução da prova portuguesa, Graton faz vir a Portugal o seu herói Michel Vaillant e restantes companheiros, com o intuito de vencer a competição.
Mas mais do que um livro de banda desenhada, “Rali em Portugal” é uma homenagem ao nosso País, pela descrição afectiva que faz dos lugares. Aliás, o trabalho de investigação observa-se extremamente bem conseguido. Não faltam as referências a personagens portuguesas como César Torres, director da prova até à sua morte ou Alfredo Vaz Pinto, vice primeiro-ministro de Marcello Caetano. Abundam as descrições minuciosas dos troços onde se desenrolam as corridas. Lisboa, Sintra, Arganil, Buçaco, Montejunto, Coimbra e a sua Universidade, Estoril e os jardins do Casino… é um autêntico roteiro turístico em forma de desenhos em quadradinhos. Aliás, a primeira vinheta trata logo de descrever a imagem única que é o avião a fazer um círculo sobre o Tejo para se enquadrar com a pista da Portela.
A Sintra o autor dedica cinco pranchas do álbum. De início os pilotos queixam-se do musgo que cobre os paralelos do piso, tornando-o numa pista de patinagem, das ruas estreitas e das curvas apertadas. É o Assalto a Sintra “porque se trata de um verdadeiro assalto: a escalada de um ninho de águias por ruelas estreitas e uma sucessão de curvas apertadas!” E vemos a Quinta Mazziotti, o arco da Penha Verde e o Largo do Vítor na confluência com o início da Estrada da Pena!!!
As onomatopeias imperam na narrativa, próprias do dinamismo deste género da acção. O virtuosismo do traço mistura-se com o realismo das representações. À época, nada de similar retratou tão bem a nossa paisagem, o nosso Património. Só o poderia ser no olhar de um outsider, pela distância que este rigor obriga.
No final da história venceu um dos heróis. Como quase sempre. Como também ganhou Sintra, em boa hora lembrada por (mais) um artista.